segunda-feira, 04/06/2018
Nesta edição, a opinião de
José Carones Azevedo, aluno de
Engenharia e Gestão de Sistemas de Informação, membro da Association for Information
Systems - UM
As métricas são vulgarmente
utilizadas cada vez por mais empresas, instituições financeiras, governamentais
e educacionais como o único meio de medir o desempenho. Será que, com este
ponto de vista, é possível e desejável utilizar indicadores numéricos baseados
em dados padronizados, em vez de confiar no julgamento de um profissional
treinado? Não é alarmante que as organizações utilizem como mecanismo de
motivação um isco de benefícios e penalizações consoante a comparação com um número
que pode não ter em conta qualquer fator contextual não inerente à métrica?
É fácil pensar em casos “de caça
à multa” pela polícia, é algo simples, mas retrata eficientemente a pintura a
traçar. As métricas incentivam a desonestidade ao sistema. Um polícia que tenha
de preencher uma cota de multas, está, à partida, mais disposto a encontrá-las
forçosamente. Mas a pintura fica pior quando pensamos na decisão de um
cirurgião que se recusa a operar um doente com problemas mais complexos, porque
poderia descer a sua percentagem de sucesso, e, em consequência, a sua
credibilidade e reputação. São inúmeros os profissionais que procuram maximizar
estas métricas de uma forma que não se enquadra no contexto da organização onde
trabalham. Como referido nos exemplos, estas recompensas não são apenas
monetárias, na forma de pagamento pelo bom desempenho, mas também sobre a
reputação, como avaliações académicas ou credibilidade social.
As métricas podem também trazer
influência para uma organização fazendo com que esta se foque demasiado no
curto prazo. Um cenário plausível é uma organização que se foca demasiado nos
resultados a apresentar num trimestre, excluindo considerações sobre
consequências futuras. Desta forma se despromove o empreendedorismo, iniciativa
e tomada de riscos. Certamente que os agentes americanos que localizaram Osama
Bin Laden trabalharam no caso durante anos e, caso a sua produtividade fosse
medida em algum ponto do tempo, esta seria medida como zero, até que, mês após
mês de trabalho, alcançaram o sucesso. Do ponto de vista dos superiores desta
equipa, era um grande risco permitir aos analistas trabalharem no caso durante
anos a fio sem que houvesse sucesso. Os recursos investidos poderiam não ter
tido qualquer retorno. No entanto, por vezes, é necessário que sejam tomados
riscos como estes para se alcançarem grandes sucessos.
É problemático que face a uma
organização que avalia o desempenho de um colaborador pelo seu resultado face
uma dada métrica, o que estão a fazer na prática é incentivá-lo a fazer apenas
aquilo que a métrica avalia, e o que a métrica avalia é geralmente um dado
objetivo. Mas isso impede a inovação, ou seja, fazer algo que não seja cumprir
esse dado objetivo, fazer algo que não fosse ainda pensado. Inovar. Inovar
requer experimentar. E, por vezes, o resultado da experiência é o falhanço, mas
tal não significa que tenha sido tempo perdido. O facto de que as métricas são
geralmente individuais, diminui também o sentido de trabalho de equipa, de
trabalhar em prol de um objetivo comum. Em vez disso, é possível que promova um
ambiente de competitividade, que até pode ser adequado em certos contextos, mas
quando se trata de uma equipa a trabalhar para um objetivo em comum, degradar
as relações sociais que motivam a cooperação entre trabalhadores não é o
caminho para eficiência organizacional.
Geralmente as organizações
pretendem que ao impor uma métrica, um dado objetivo seja cumprido, mas o que
pode acontecer é o contrário, ou seja, os objetivos pretendidos sejam
modificados para acompanhar a métrica. Isto é um exemplo que eu, como
estudante, vi acontecer durante o meu percurso estudantil. O fenómeno do
“ensinar pelo teste’, que mesmo sendo certamente menos prevalente na minha
experiência no ensino superior, assombra as escolas básicas e secundárias,
inflacionando os resultados dos estudantes, mas deteriorando a aprendizagem dos
estudantes.
Outro ponto negativo do uso de
métricas é o custo das mesmas. O tempo despendido por outros cuja tarefa é
compilar e organizar estas métricas em primeiro lugar, assim como o tempo
requerido para analisar os resultados pode sair caro.
Em
suma, as métricas funcionam como um paradoxo, podem trazer benefícios, como a
facilidade de controlo do desempenho de um colaborador, mas também podem fazer
com que os colaboradores acabem a trabalhar mais e mais tempo em atividades que
pouco trazem em termos de valor à organização, podendo ainda afetar a sua
motivação. E as organizações, numa tentativa de tornar este sistema funcional,
impedindo tentativas de manipulação resultantes da imposição do sistema, acabam
por impor regras que resultam apenas numa desaceleração dos processos e
resultados da organização.